terça-feira, 16 de setembro de 2008

Carimbo Tricolor

Algumas coisas que acontecem na vida da gente marcam de forma definitiva o nosso futuro. E a forma como eu me consagrei um Tricolor, assim mesmo, com letra maiúscula, certamente foi uma das coisas que mudou a minha vida. E para o bem. Eu digo “me consagrei” – e não “me tornei” – porque sendo filho do velho Comandante Nonato, o maior Tricolor que conheci, é evidente que em minhas veias corria desde sempre sangue pó-de-arroz. Mas ainda assim era necessária a consagração. E vamos aos fatos.

Para ser muito sincero, o ano eu não me lembro. Arriscaria que foi em 81, mas não tenho certeza. Eu era um moleque de três anos e poucos meses de idade, morando em São Pedro d’Aldeia, no estado do Rio, quando o velho me disse que eu ia conhecer o Maracanã. O jogo havia sido escolhido de forma propícia, um Fluminense e Portuguesa da Ilha, e idealmente seria uma vitória sem sustos pro torcedor-fraldinha aqui deitar e rolar. Por capricho dos deuses da bola, um tal de Buga meteu dois gols, perdemos por dois a zero e só me lembro mesmo da nossa própria torcida se retirando pelas rampas do maior do mundo gritando em autogozação o nome do nosso carrasco. Meu pai não deu muita bola para aquilo e acredito eu que aquele quase desprezo pela derrota tenha sido baseado na certeza daquele marujo velho de guerra de que seu filho tinha pinta de vencedor, e assim sendo só poderia torcer pelo clube tantas vezes campeão.

Dois ou três dias depois do jogo lá estava eu na escolinha de futebol todo uniformizado, o que tranqüilizou mais ainda o velho. Mas o fato é que eu ainda precisava de um batismo de verdade, de uma cerimônia digna de apresentação ao time por quem iria torcer até o fim da vida! E de maneira corajosa o velho decidiu me levar a um Fla-Flu coisa de duas semanas depois daquele jogo do Buga. Digo corajosa porque o time do Coisa Ruim tinha àquela época Zico, Adílio, Leandro, Raul, Júnior e mais alguns. E o nosso time era bem mais fraco, nos restando basicamente a força da camisa listrada. Também me lembro pouco desse jogo. Na verdade o único momento que me vem à cabeça foi de uma explosão de alegria fascinante e nunca antes experimentada que veio a suceder um chutão de nossa defesa. Este “brilhante lançamento” foi parar nos pés de um certo Amauri que fez o caroço morrer mansamente nas redes adversárias. Um a zero para nós e ponto final. E o barulho e alegria do lado do bem se contrapunham ao silêncio do lado do mal. Um momento de pura poesia no Maraca. Uma verdadeira consagração para um tricolor-mirim.

Naquele dia e naquele estádio que eu viria a pisar mais uma infinidade de vezes eu estava indelevelmente carimbado: Tricolor! Com letras maiúsculas e graças ao meu pai! Se cuida aí em cima, velho! E vê se aparece no Maraca quando puder pra dar aquela força.

(Marcos Gurgel - 17/01/2005)

* Texto enviado pelo amigo Edson. Obrigada!

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